Projeto FX

O status atual

 

O ano de 1998 se encerrou com a visita recente dos Sukhoi Su-27/30 ao Brasil, que passaram por Anápolis vindos do Chile, outro país sulamericano que estuda a compra de novos caças. Os aviões russos causaram ótima impressão aos militares brasileiros. O que já era esperado, visto que o Su-27 é o que há de mais moderno em termos de aviação de caça em produção no mundo hoje em dia.

Sukhoi Su-27: reconhecidamente o caça mais mortífero da atualidade. Além da aviôncia e armamentos avançados que permitem a detecção e destruição de múltiplos alvos a longas distâncias, a família Su-27 surpreende pela combinação de longo alcance e extrema agilidade no combate a curta distância ("dogfight") apesar das suas grandes dimensões. Desenvolvido como caça padrão de defesa da "Mãe Rússia" está sendo oferecido ao mercado externo, inclusive em configurações mais sofisticadas que as usadas pela própria Rússia. Também é utlizado pela China e pela Índia.

 

O contato com o Su-27 estimulou a imaginação dos nossos militares e amantes da aviação militar. O preço sugerido de US$ 40 milhões em comparação ao desempenho oferecido é realmente baixo, sem dúvida a melhor relação custo/benefício entre os concorrentes do programa FX. As dimensões continentais de nosso país apontam (assim como a própria ex-URSS) para um interceptador como o Su-27, capaz de missões de longa duração contra múltiplos alvos.

Os outros concorrentes do Su-27 seriam o F-16 e F-18 americanos, o Mirage 2000 francês, o Gripen sueco e o Mig-29 também russo.

O modelos americanos sofrem com as restrições do governo dos EUA que é muito reticente em fornecer armamento de última geração à América Latina. Isso é fruto das décadas passadas, quando os próprios EUA incentivaram a criação de ditaduras militares que por sua vez levaram a um clima de constante instabilidade política dentro e entre esses países. Certamente os analistas políticos do governo americano temem que conflitos como a Guerra das Malvinas e o conflito Equador-Peru se repitam. Porém, existe um lobby muito forte dos fabricantes norteamericanos para que as exportações sejam liberadas. Como existem fortes indicativos que a democracia é sólida na maioria dos países talvez a venda de armas modernas seja liberada a países como Chile, Argentina e Brasil.
De qualquer maneira, nesse momento, o governo norteamericano preferiria nos fornecer equipamento menos sofisticado, como F-16A e F-18A de segunda mão. Os militares brasileiros entretanto estariam interessados apenas nas versões mais modernas destas aeronaves. Pessoalmente, entendo que a opção de caças de segunda mão não deve ser descartada. Mas voltarei a esse assunto depois.

A França, país que se aproveitou das restrições dos norteamericanos na America Latina, é hoje um dos principais fornecedores de armamento da região. Portanto, conta com a tradição a seu favor. O Mirage 2000-5 oferecido ao Brasil é uma versão que utiliza alguns aviônicos destinados ao Rafale, sendo realmente multifuncional e prometendo custos de manutenção inferiores aos Mirages anteriores. Note que é critica comum o alto custo de manutenção dos aviões franceses, em função do alto preço das peças de reposição. O desempenho de vendas do Mirage 2000 também foi um sucesso relativo. A Índia iniciou a produção local mas preferiu o Mig-29. Taiwan adquiriu o Mirage 2000-5, aparentemente como forma de pressão para adquirir as últimas versões do F-16 (que estão sendo entregues em maior volume) e para não depender totalmente dos EUA que vinham estreitando os laços com a China comunista. O Egito também fez o mesmo "jogo" de Taiwan, usando alguns Mirages e vários F-16.

Os suecos desenvolveram um caça pequeno e moderno, concebido especialmente para reduzir custos de manutenção. O Gripen é um caça realmente multifuncional e adequado para operar de pistas curtas. Todavia foi desenvolvido como um caça de reação rápida, possuindo um raio de açaõ pequeno para missões de escolta e patrulha. Além disso é um projeto novo, que ainda sofrerá problemas no início de sua vida operacional, levando a modificações e revisões de projeto. Mesmo assim, caso haja assistência técnica adequada, é uma boa opção.


O Gripen tem a seu favor um projeto moderno, de quarta geração, que garante uma real capacidade multifuncional e alto desempenho. Porém, por ser um produto muito recente, não está totalmente desenvolvido. Tem um alcance operacional relativamente pequeno, que pode ser compensado em parte através de reabastecimento em vôo. Também foi desenvolvido para ser de fácil e barata manutenção. Podendo ser assistido inclusive por equipes conscritos, que prestam um ano de serviço militar.

 

Os russos são as novas opções no mercado ocidental, oferecendo o que há de mais moderno na sua indústria militar. Isso, em termos de aeronaves militares, significa ter acesso aos melhores caças da atualidade.

O Mig-29 é um caça tático de interceptação e escolta, concebido para substituir os Mig-21 e Mig-23 na Aviação Frontal Soviética (a força aérea do exército soviético). Operaria em conjunto com aeronaves de ataque Su-25 e Mig-27 a partir de bases semipreparadas, acompanhando o avanço das forças terrestres. Originalmente é um caça bem simples e robusto, dispensando sistemas "fly-by-wire" e a concepção HOTAS e com uma capacidade de ataque ao solo bem limitada. É um caça mortífero no combate corpo-a-corpo utilizando misséis Archer, cujo sistema de localização IR pode ser acoplado a um designador de alvos no capacete do piloto, isso permite fixar alvos deslocados até 60º em relação ao eixo longitudinal do Mig-29. Também está equipado com mísseis de médio alcance Alamo que podem atingir alvos a mais de 70km. Esse desempenho levou a Malásia a adquirir o Mig-29 como seu interceptador padrão. Porém, para missões de ataque optou por biplaces F-18D.
A empresa MAPO (nome comercial da antiga equipe de projeto, OKB, Mikoyan/Gurevitch) já oferece ao mercado versões mais sofisticadas desse caça, incorporando avanços que lhe dão características multifuncionais, mais ao gosto da maioria dos clientes potenciais. A pequena autonomia (apenas 2000km de alcance nos primeiros modelos), vem sendo combatida com aumentos na capacidade interna de combustível e versões menos "beberronas" do turbofan RD-33, sendo que a última versão incorpora uma corcunda com tanques extras (como o F-18).

Uma questão importante é a confiabilidade dos equipamentos russos. No ocidente confiabilidade significa durabilidade, um ponto de vista diferente do soviético. Uma turbina, por exemplo, que precise ser revisada a cada 300 horas de vôo é um desastre em termos de manutenção no ocidente. O conceito soviético é diferente, pois a unidade de combate se dedica apenas às manutenções mais simples. As turbinas são substituídas em um esquema planejado de rodízio, mantendo as aeronaves sempre disponíveis (elas são portanto, confiáveis). Abrindo mão da durabilidade consegue-se turbinas de alto desempenho e baixo custo, ao contrário do ocidente que utiliza materiais caros e resistentes para garantir durabilidade a suas turbinas. Esse mesmo conceito se estende inclusive à própria estrutura dos caças soviéticos que tem uma vida útil menor, viabilizando de outro lado a fabricação em grande escala, que era vital na estratégia da ex-URSS.
Esse ponto é muito importante, agora que paises como o Brasil analisam seriamente a possibilidade de adquirir armamento do antigo bloco soviético, pois estes trazem conceitos (estratégicos, táticos e logísticos) que diferem dos usuais de influência ocidental. Peru e Malásia já se declaram insatisfeitos com a assistência técnica dada e com a qualidade dos componentes.
Existe inclusive uma anedota da 2ª Guerra Mundial que ilustra esses pontos de vista divergentes
(extraído do livro da série "Aviões de Combate: MIGs" de Bill Sweetman): Em sua investida para o leste a Wermacht capturou um tanque T-34 que vinha superando os tanques alemães. Apesar do interesse pessoal do próprio Hitler de ter um tanque igual em suas forças armadas, o relatório dos técnicos do 3ºReich concluiu que os alemães nunca seriam capazes de construir um tanque como aquele, porque ele simplesmente não passaria no controle de qualidade!

O outro concorrente é o Su-27 citado no início do artigo. É uma aeronave que está em outra classe de interceptador, sendo inclusive maior do que o Eurofighter e o F-15. Porém, o preço oferecido é extremamente convidativo, mas mesmo assim alto, o que limitaria o número a ser adquirido pelo Brasil. Outro ponto a ser levado em conta é de que a aquisição pelo Brasil de um caça destas características pode causar algum desconforto aos nossos vizinhos. Apesar do clima de cooperação existente, os paises sulamericanos usam as forças armadas dos seus vizinhos como referência. E a presença de caças multifuncionais de longo alcance, armados com mísseis de alcance "além-do-horizonte" é algo inusitado nessa região do globo, podendo levar a uma certa escalada armamentista, algo totalmente desconselhável no atual momento econômico.

 

Opções de momento e a repontencialização dos F-5E

Este é outro ponto que gostaria de abordar. Há pelo menos dez anos a obsolescência dos F-5 e Mirage é uma unanimidade e a substituição e/ou modernização dos mesmos urgente. Bem, dez anos depois, existe um aparente concenso de que o Mirage III passou do momento ideal para ser modernizado. O ideal seria adquir um novo caça (qualquer um dos concorrentes do projeto FX) e modernizar os F-5 com aviônicos modernos para que estes ficassem na linha de frente até 2010/2015, quando o novo caça estaria totalmente operacional. Como a modernização seria paulatina isso significaria em torno de 12 anos de operação para estes caças a um custo de US$300milhões para 50 aparelhos.

Todavia, temos que acompanhar a situação geopolítica do momento, e tirar vantagem dela.

A chamada "nova ordem mundial" se caracteriza pela rápida intervenção em diferentes partes do globo. Um cenário desse tipo exige versatilidade da aviação de caça, que pode em um dado momento realizar patrulhas aéreas e no outro ter de desempenhar funções de ataque com armamento inteligente. Por questões de custo não é possível mobilizar um grande número de aeronaves especializadas para operações como as realizadas sobre a Bósnia. Assim, as aeronaves devem ser multifuncionais. Em função disto as forças armadas a Guarda Aérea NorteAmericana está substituindo precocemente seus F-16 ADF por aparelhos F-16C multifuncionais. Obviamente o pequeno volume de encomendas nas fábricas da Lockeed também incentivou a substituição.

O F-16 ADF (Air Defense Fighter) é uma versão dos primeiros F-16A construída especialmente para o National Air Guard. A capacidade de ataque é limitada, mas o radar APG-66 foi alterado para iluminar mísseis Sparrow e dispõe de aviônicos preparados para decolagens rápidas. A vida útil das células garante ainda vários anos de operação.

O Brasil está em uma situação especial pois possui uma aeronave moderna de ataque (AMX), podendo optar por uma aeronave especializada em interceptação. O F-16 ADF mantém as mesmas características de manobrabilidade e boa autonomia de toda família F-16. Adquirir misséis de médio alcance é algo indesejável politicamente, como já coloquei. Porém, caso a situação se altere o F-16 poderá ser armado com tais mísseis imediatamente.

Caso o Brasil negocie corretamente, o custo de aquisição de +/-30 aeronaves será inferior ao da modernização sugerida para o F-5. A aviônica o do F-16 ADF seria inferior, mas o caça em si é superior e teria uma vida útil maior.

A modernização do F-5 seria a princípio descartada, e alguns poderiam ser vendidos junto como os Mirage. Um upgrade menor poderia ser realizado em alguns F-5, mantendo o radar original com alguns módulos novos e incluindo um HUD e computador de tiro. Uma modernização semelhante está sendo proposta para o Mig-23 (ver AirForces Monthly de outubro de 98), por algo em torno de US$500mil por aeronave.

Aparentemente, os militares são contrários à aquisição de aeronaves de segunda mão. Mas os sucessivos atrasos na modernização dos F-5 vem tornando a mesma cada vez menos interessante. De outro lado, a falta de recursos impede a aquisição imediata de aeronaves novas. Somado a isso existe uma oportunidade de adquirir aviões de bom desempenho a baixo custo. A própria Marinha Brasileira deu o exemplo adquirindo fragatas da classe Broadsword , uma compra de oportunidade que elevou em muito o poderio de nossa marinha de guerra.

A compra de quatro fragatas da classe Broadsword pela Marinha Brasileira, constitui um exemplo típico de compra de oportunidade, fruto de uma visão pragmática e da atenção ao momento geopolítico do planeta.